sexta-feira, 11 de março de 2011

Com carinho...

Os dias andam tão corridos e as preocupações tem se tornado tão frequentes, que o passado vai ficando para trás, quase esquecido em meio a tantas lembranças. Aí foi ontem, bem no fim da tarde, quando escrevi felicidades ao meu professor de Reportagem Impressa e desejei-as por telefone ao amigo vendedor de óculos da Chillie Beans, que me lembrei que pai completaria seus bem vividos 53 anos (ou seriam 54?) nesse 10 de março. Vai ver foi por isso (e só agora compreendi) que o dia amanheceu tão bonito, o céu todo azul, como não se via desde a última sexta-feira (embora tenha anuviado e acinzentado tudo outra vez mais tarde, deixando a noite meio fria). Talvez tenha sido um presente, desses que parecem coisa de Deus mesmo, embora eu às vezes acredite pouco e tenha consciência de que deveria ter um bocado mais de fé, só pra garantir que me valham algumas orações, principalmente as de vó, que incluem cada neto que ela mais estima, até os emprestados e os recém agregados...

Dormi bem depressa, mas fiquei pensando (no ônibus de volta pra casa, com a janela aberta, um vento fresco cortando o rosto) no que seriam as coisas se pai ainda estivesse aqui. Talvez eu não teria saído de casa ou talvez teria me mudado com o coração mais tranquilo deixando alguém pra cuidar de ser companhia pra mãe. Talvez ele nem estivesse mais trabalhando, pois (se me lembro bem e corretamente) perdera já o movimento de uma das mãos num acidente com essas máquinas pesadas. Talvez ele nem estivesse aqui de todo jeito, já que se foi com os pulmões bem corroídos pela tal nicotina e todas as outras "inas" presentes no maldito cigarro. Talvez eu não tivesse sofrido tanto e nem me sentisse tão sozinha e perdida nesse mundo grande demais, como me sinto quase todas as manhãs.

Pai não teve tempo de conhecer meus poucos amigos, de ouvir de perto (e nas minhas mãos) um violino, de ver a revista que ajudei a fazer, de ler os textos que escrevi e as fotos que tirei publicadas no jornal da faculdade. Pai não teve tempo de comemorar o diploma de Direito nem a carteira de motorista tão batalhados pela filha mais velha, nem de ver o resultado da luta de mãe pra fazer o muro da frente e pintar as janelas lá de casa todas de branco. Pai não teve tempo de ver que a cidade cresceu e não vai ver mais um monte de coisas porque o tempo passou e quanto mais ele passa, mais as lembranças de vida vão ficando distantes dando lugar pra saudade e falta enorme que só pessoas queridas fazem...

Eu não tive tempo de olhar pra pai e dizer das coisas todas que sempre senti. Porque era pequena demais ou vai ver porque não sabia usar as palavras ou porque sempre pensei que pai e mãe fossem coisas eternas. E a gente sempre com essa mania besta de ir deixando um abraço pra depois, um sorriso pra depois, o amor pra depois, sem perceber como que o depois pode ser tarde demais...

Aí eu queria dedicar esse post (enorme por sinal) a todas as pessoas que passarem por aqui e se lembrarem com carinho de alguém que se perdeu. E também (e principalmente) àquelas que podem olhar para o rosto de seus pais todas as manhãs ou noites e mesmo que não todas, mas que de alguma forma (que não seja por fotografias) podem olhá-los e ainda os tem ao alcance de um abraço.

A vida, eu descobri que é frágil e delicada demais. E o tempo, é veloz, não espera que as coisas aconteçam, apenas corre transformando em frações de segundos tudo ao nosso redor...

5 comentários:

Liv Milla disse...

Talvez ele não tenha tido tempo de ver seu crescimento, em vida!
Mas acredite, ele estará sempre ao seu lado, te dando forças a cada batalha e aplaudindo cada conquista.
Ele jamais deixará de cuidar de vocês...
Cuide-se!

João Killer disse...

Do que vale minhas palavras diante desse post?! Provavelmente nada. Perfeito!

Nelio Souto disse...

meu deus! um dos textos mais lindos que já li...

a presença física vai mas as relações ficam e se traduzem de outras formas... como numa música que você por ventura venha a compor pra ele.
beijo!
você me enche de orgulho.

Anônimo disse...

Apesar de que normalmente esse post teria uma cor mais cinza ou amarronzada, pelo aspecto de perda, de falta, de coisa meio oca, eu vejo um tom de azul muito lindo nesse post, uma serenidade imensa, um azul de céu muito vívido!

Caroline. disse...

Não tive tempo de olhá-lo uma, duas, milhões de vezes e dizer aquilo que sempre deixei pra depois.
Um dos mais lindos que ja li! De escorrer lágrimas dos olhos.
Parabéns!